Rúgbi aplica tolerância zero e dá exemplo no controle de doping
UOL Esporte
A Agência Mundial Antidoping (Wada) classifica o programa Keep Rugby Clean (Mantenha o Rúgbi Limpo, em tradução livre) como um dos grandes casos de sucesso do mundo esportivo. Criado há 10 anos pela entidade máxima do esporte, a World Rugby, ele já testou mais de 13 mil jogadores. Só no ano passado, foram realizados 2.100 controles de sangue e urina, um novo recorde na história da modalidade. Foram apenas quatro resultados positivos.
De 2014 para 2015, a World Rugby ainda aumentou em 30 % os investimentos no programa – a falta de verba é um dos argumentos da Wada para explicar gargalos em escândalos como o que envolve o atletismo da Rússia, por exemplo. Neste ano de Copa do Mundo de Rúgbi, o novo orçamento garantiu a realização de mil testes, contando apenas atletas relacionados ao Mundial (620 ao todo, entre titulares e reservas).
Ainda como parte da política de tolerância zero contra o doping, todas as vinte delegações que competiram na Copa foram obrigadas a participar de um programa de educação antes da competição. Além do Keep Rugby Clean e da Wada, um controle extensivo foi realizado durante o Mundial 2015, a cargo da UKAD, a agência britânica antidoping.
A UKAD já é a responsável pelos testes nas principais ligas da Inglaterra, Escócia e País de Gales, além dos torneios que unem equipes da região. A entidade possui até uma linha telefônica direta e um e-mail para denúncias, em parceira com a União Inglesa de Rugby (RFU), que garante confidencialidade nas informações.
Em 2015, a World Rugby também lançou seu programa de passaporte biológico de atleta, o ABP, monitorando jogadores com mais frequência, semelhante ao que ocorre em modalidades como o ciclismo. Todo o arsenal do rúgbi contra o doping visa manter as principais competições livres de testes positivos. Fora o Mundial, os programas dão conta de controlar jogos classificatórios para as Copas, mundiais femininos, juvenis e de Sevens (a modalidade olímpica).
É um ótimo exemplo. Mas só sustenta uma porcentagem minúscula dos praticantes. A imensa maioria dos atletas do mundo joga em ligas menores (amadoras ou profissionais) e estão sujeitos as mesmas pressões, armadilhas e vaidades de outras modalidades.
Aliás, não é preciso ir muito longe do centro do rúgbi – a Inglaterra inventou o esporte e a Irlanda é a sede da World Rugby – para encontrar alguns casos. Em maio de 2013, o escocês Sam Chalmers, de 19 anos, jogador do centenário clube Melrose foi flagrado em treinos para o Mundial juvenil e acabou banido por dois anos. Com era filho de um famoso jogador dos Lions britânicos, o caso fez barulho na imprensa local.
Na França, também em 2013, Jean-Pierre Élissalde (que já defendeu sua seleção) confirmou já ter tomado anfetaminas na carreira, e disse que nas décadas de 1970 e 1980 era possível encontrar outras formas de doping, visando maior potência física – só em 1995 o rúgbi se tornou oficialmente profissional.
Em entrevista à revista World Rugby, no entanto, Élissalde disse que em toda sua carreira na elite da França nunca viu pressão de gerentes, treinadores ou qualquer outra pessoa envolvida no esporte para uso de doping. Não há mais casos recentes envolvendo grandes figuras do esporte.
Nomes famosos da bola oval inclusive são embaixadores da causa antidoping. É o caso de Felipe Contepomi, ex-seleção argentina e médico de formação, e de jogadores de primeira linha, ainda na ativa, como David Pocock (Austrália), Sam Warburton (País de Gales) e Bryan Habana (África do Sul).
O esforço é grande e valido. Ainda que, como em todo esporte, haja brechas para escolhas pessoais erradas. A própria UKAD afirmou recentemente que é impossível eliminar o doping graças aos testes em um determinado grupo de jogadores de elite. Segundo Andy Parkinson, diretor-executivo da entidade, pela natureza do esporte, sempre aparecerão pessoas que tentarão cruzar essa linha.
É por isso que a estratégia atual da World Rugby, em parceira com as Uniões, é focar na prevenção da nova geração. De suplementos vendidos em todos os lados às promessas comercializas na internet, as emboscadas se multiplicam. Some a isso a pressão por conseguir espaço nos times principais e a idolatria pelos astros do rúgbi. A molecada assiste, se espelha, e quer ser igual – e pode se confundir buscando um atalho.
Neste caldeirão, o rúgbi volta mais uma vez para seus valores básicos e para o espírito coletivo. Se eles não forem suficientes para convencer um atleta, a World Rugby aposta na punição.
Desde janeiro de 2015, um teste positivo passou a ser punido com quatro anos – antes eram dois. A nova mensagem está bem clara. Mantenha o rúgbi limpo. Ou, se for pego, dê adeus à sua carreira.