Mundial revela potências e líderes improváveis
UOL Esporte
Por Bruno Romano
Mamuka Gorgodze comemora com torcedores da Geórgia (Crédito: Reuters/Paul Childs Livepic)
Um dos grandes ensinamentos do rúgbi é a coletividade. Você aprende isso na marra. Se tentar passar, sozinho, por quinze adversários logo vai perceber que o passe e o apoio são caminhos mais inteligentes. É por essas e outras que no rúgbi a palavra “craque” perde espaço para “líder”.
O craque lembra mais aquele atleta intocável, cheio de habilidade, mas que faz o mínimo esforço possível, graças ao seu “talento divino”. No rúgbi, por outro lado, é preciso ser mais do que técnico e brilhante em campo. Muitas vezes, o jogo exige o trabalho sujo. O que não tem nada a ver com violência, mas sim com esforço, coragem e um sentimento convicto de se doar pelo time.
Depois de oito intensos jogos da Copa do Mundo de Rugby 2015, elegemos os líderes que mais marcaram o torneio até aqui:
O GODZILLA EXISTE
Mamuka Gorgodze não ganhou o apelido de “Gorgodzilla” à toa. O camisa 8 da Geórgia faz seus 1.96 metros de altura e 120 quilos se multiplicarem dentro de um campo de rúgbi. Ele liderou a incrível vitória de seu país contra Tonga – não os venciam desde 1999 – anotando o primeiro try, fazendo oito offloads (passes enquanto está sendo derrubado) e garantindo 24 tackles (movimento de derrubar o adversário com os ombros e braços). Até agora, é o maior tackleador do Mundial.
Gorgodze trocou o basquete pelo rúgbi aos 17 anos. Um ano depois, em 2003, já estava na seleção nacional da Geórgia. Em 2005 começou no Montpellier uma carreira de destaque no rúgbi francês, o mais rico e disputado da Europa. E na temporada 2010/2011 foi nomeado o melhor estrangeiro do torneio. Desde 2014, defende o Toulon, clube francês conhecido por unir grandes destaques internacionais do rúgbi.
Mamuka Gorgodze se prepara para um scrum no Mundial (Crédito: AFP PHOTO/ BERTRAND LANGLOIS)
GUERREIROS DO NOVO RÚGBI
Três nomes ficaram marcados na imprevisível vitória do Japão sobre a bicampeã mundial África do Sul por 34-32: o fullback Ayumi Goromaru, o oitavo Michael Leitch e o ponta reserva Karne Hesketh.
Goromaru fez 24 dos 34 pontos (um try, duas conversões e cinco penais). Depois de estrear pelo Japão em 2005, com 19 anos, ficou de fora dos Mundiais de 2007 e 2011. Só ganhou nova chance em 2012, quando jogou todas as partidas do Japão na temporada e acabou como artilheiro do ano. Desde então, ganhou espaço e confiança dos treinadores e companheiros. Por tanto esforço, foi finalmente coroado no último sábado.
Já Michael Leich nasceu na Nova Zelândia, tem raízes familiares em Fiji e acabou na seleção do Japão. Em sua segunda Copa do Mundo traz na bagagem temporadas na Top League japonesa e no Super Rugby, maior torneio de clubes do hemisfério sul. Não é muito se comparado aos 851 caps (número de aparições em jogos oficiais) da seleção sul-africana nesta Copa. Mas foi o suficiente para anotar 17 tackles, um try e liderar o Japão como capitão no dia que mudou a história do esporte no país. Detalhe: Michael se recuperou de duas fraturas, no braço e na perna, para chegar inteiro à Inglaterra.
Por fim (de propósito), Karne Hesketh. Totalmente fora dos holofotes no seu país de origem, a Nova Zelândia, Hesketh só tocou uma vez na bola contra a África do Sul. Entrou faltando um minuto para o apito final e, quatro minutos depois, já com o tempo regular esgotado, recebeu um passe para fazer o try da vitória. Nos últimos cinco anos, Hesketh tinha sido rebaixado duas vezes com seu time japonês, o Fukuoka. Ele mesmo admitiu que já estava extremante feliz e realizado só de ter ido para o Mundial.
Karne Hesketh comemora try do Japão contra a África do Sul (Crédito: AFP PHOTO/LIONEL BONAVENTURE)
AMADORES DE ELITE
Todos os 31 jogadores uruguaios estão estreando em mundiais nesta edição 2015. Entre estudantes, empresários, profissionais liberais e alguns doutores, o capitão Santiago Vilaseca lidera uma equipe que só tem quatro atletas profissionais (três jogam na França e um na Itália). Vilaseca trabalha em um banco, já tinha gastado suas férias com compromissos internacionais pela seleção e foi obrigado a negociar dois meses de trabalho não remunerados para ir à Inglaterra comandar os Teros.
Santiago Vilaseca é um dos atletas amadores do Uruguai na Mundial (Crédito: AFP PHOTO/LOIC VENANCE)
DICA DO DIA: A #RWC2015 tem um aplicativo oficial completo e atualizado. Se ainda não baixou, aproveite a folga nos jogos para dar uma olhada na agenda (e acertar a data daquele churrasco), além de conferir escalações, fotos e vídeos.
O CARA: Depois de estrear com vitória sobre Fiji (e antes de encarar um duelo decisivo contra País de Gales), o treinador da Inglaterra Stuart Lancaster mostrou a essência do rúgbi. No último domingo, ele foi conferir de perto os jogos das crianças do seu clube, o West Park RUFC, em Leeds. Mesmo no papel de head coach de Inglaterra, Lancaster segue trabalhando (sem receber) para as categorias de base que o formaram.
A IMAGEM: Campeão mundial pela África do Sul em 1995, o ex-scrumhalf Joost van der Westhuizen encontrou a seleção de Samoa, na Inglaterra. “Obrigado @manusamoa pela visita surpresa. Incrivelmente abençoado por fazer parte da #rugbyfamily [família do rúgbi]. Boa sorte na #RWC”, disse Joost, considerado um dos maiores camisas 9 da história, que sofre de uma rara doença degenerativa. “Somos nós que te agradecemos Joost”, respondeu @manusamoa.
Thank you @manusamoa for my surprise visit.Incredibly blessed to be a part of the int #rugbyfamily.Good luck for #RWC pic.twitter.com/ieVzxFkzHI
— Joostvdwesthuizen (@9Joost) September 21, 2015
A FRASE: “Ninguém poderia ter escrito isso…”, J.K. Rowling, escritora inglesa, autora da série de ficção Harry Potter, comentando a vitória do Japão sobre a África do Sul, via Twitter.
LONDON EYE: Com apenas 22 anos, o centro do País de Gales Cory Allen anotou três tries contra o Uruguai. Com uma contusão na perna, porém, o artilheiro do Mundial até aqui deixa de vez o torneio. Gales já convocou Tyler Morgan, do Newport Gwent Dragons, para o seu lugar.